Heroína vs Metadona

Do ponto de vista toxicológico, há um aspecto que se torna muito importante, nomeadamente a comparação entre os efeitos tóxicos da heroína e da metadona.
Um estudo levado a cabo por Shane Darke e seus colaboradores em 2009, comparou toxicologicamente as overdoses fatais provocadas por heroína e por metadona. Procederam à análise de fármacos e outras drogas de abuso no sangue, bem como à autópsia dos corpos e avaliação de anomalias cardíacas, respiratórias, hepáticas ou renais prévias à overdose. Este estudo revelou os seguintes resultados:

Nesta tabela, verifica-se que a probabilidade de encontrar benzodiazepinas num indivíduo com morte por overdose de metadona é superior à probabilidade de encontrar numa overdose por heroína. O que revela um efeito mais potente na depressão do SNC mediado pela metadona em conjunto com benzodiazepinas. É necessário alertar os indivíduos que tomam metadona quanto aos efeitos nefastos de uma associação desta natureza. Os clínicos devem ter muita atenção na prescrição deste tipo de fármacos a estes indivíduos. No que diz respeito a outros opióides, como a morfina e a codeína, a interacção é muito maior no caso da heroína. Notar que a codeína é utilizada como anti-tússico de uma forma banal. É necessário alertar os heroinómanos e mesmo os indivíduos que tomam metadona para uma eventual interacção a este nível. A interacção com o álcool é muito mais problemática no caso da heroína, sendo maior a probabilidade de encontrar álcool no sangue de um indivíduo cuja morte foi provocada por overdose de heroína, do que numa overdose por metadona.
É importante atentar nas interacções com drogas de abuso, que difere entre metadona e heroína, note-se que a interacção mais importante é a interacção com cocaína, mais grave no caso da heroína. Notar uma maior interacção entre anti-depressivos e anti-psicóticos e a metadona, pelo que os clínicos devem ter cautela da prescrição destes fármacos a estes indivíduos.

Estes valores dizem respeito aos achados das autópsias dos indivíduos, quer os que morreram por overdose com metadona, quer por overdose com heroína.
O que podemos concluir é que nos indivíduos que morreram por overdose com metadona apresentam uma maior incidência de perturbações cardíacas, pulmonares, hepáticas ou renais prévias. Não podemos atribuir o desenvolvimento desses quadros à utilização de metadona, até porque a maior parte destes indivíduos tinham tido já um historial de utilização de heroína, assim como há alguns que morreram por intoxicação por metadona que não estavam sob terapia continuada de substituição da heroína.
Observou-se um maior número de complicações sistémicas prévias nos indivíduos que morreram por overdose com metadona.
Este estudo aponta sim para a necessidade de monitorizar indivíduos em terapia de substituição com metadona a diferentes níveis.
Não podemos neste momento afirmar que a Metadona é a responsável pelas perturbações várias e prévias à overdose, mas este estudo mostra-nos a necessidade de fazer estudos com dosagem e períodos de consumo controlados para averiguar as implicações a nível dos diferentes sistemas. São necessários estudos para avaliar o efeito isolado da metadona e da heroína, bem como o efeito da metadona após consumo prolongado de heroína.
Poderá a metadona ter um efeito potenciador nas alterações sistémicas previamente causadas pela heroína? Essa é uma das questões que para já não há resposta.
É importante averiguar qual o mecanismo pelo qual estes compostos induzem alterações morfológicas e funcionais em cada um destes sistemas.

Bibliografia:

  • Darke, S.; Duflou, J.; Torok, M.; The comparative toxicology and major organ pathology of fatal methadone and heroin toxicity cases; Drug and alcohol Dependence no 106 pp 1-6; 2010